• Encontro com ‘divas da terra’ foi partilha de impressões e um futuro que se constrói


    O papel da mulher rural, desafios e o seu envolvimento no desenvolvimento do país é cada vez mais destacado na sociedade. Elas representam cerca de 80 por cento da mão de obra na agricultura familiar em Angola. São as “artistas” da terra e das sementes. Dialogam com as chuvas e com o sol. Sabem quando plantar e quando colher. São agrónomas sem escola. São divas da terra.

    No mês dedicado à Mulher Rural, cerca de 200 mulheres do meio rural, que representaram os 11 municípios da província do Huambo, mantiveram um encontro com a Vice-Presidente da República, Esperança da Costa, aquando da sua visita de três dias de trabalho àquelas terras  do Planalto Central.

    O encontro aconteceu no município do Cachiungo, terra que emana favos de mel. Falou-se do ponto de situação da mulher rural na província do Huambo, com realce para os principais desafios e melhoria do quadro actual. As camponesas do Bailundo, Cachiungo, Caála, Ekunha, Huambo, Londuimbale, Longonjo, Mungo, Tchicala-Tcholoanga, Tchindjenje e Ucuma pediram soluções para a questão do acesso à terra, ao micro-crédito, dos fertilizantes e escoamento dos produtos. Mas, as necessidades dessas mulheres rurais do Huambo, que são esposas, mães e donas de casa, vão muito além das enfrentadas no campo.

    As representantes de cada município pronunciaram-se na sua língua materna, o Umbundu, com retórica profunda, de alcance moral, político e social. Elas são articuladas e sabem sobre o que dizem, e fazem-no sem hesitação. Soou bem ouvi-las. A cultura é bela e é a alma da nação!

    Foi um momento inesperado ao ouvi-las todas a falar em Umbundu, e ao mesmo tempo épico. Muitos precisaram de tradução. Em poucos minutos, e com alguma "elegância real”,  elas falaram da necessidade de terem mais serviços sociais básicos, mais educação para os filhos, capacitação e formação profissional e, sobretudo, da urgência de o Executivo olhar com olhos de ver para a situação da violência doméstica e da gravidez precoce, fenómenos que ocorrem frequentemente nas suas comunidades e com um índice considerável.

    O encontro, apesar de curto, foi um momento único e muito intenso para as mulheres, que, com alegria, cantaram e aplaudiram pela iniciativa e por contarem com o apoio da figura da Vice-Presidente da República.

    Para Florinda Jerónimo, do município do Longonjo, nem tudo são dificuldades. Ela falou da cooperativa agrícola de mulheres Tuapama e do apoio do Governo Provincial do Huambo, que tem sido fundamental para a actividade no campo.

    "Por exemplo, no nosso município, temos o Tuapama, uma cooperativa, que tem contado com o apoio da governadora. Por isso, não tenho muitas queixas”, sublinhou com ar alegre e visivelmente satisfeita com as garantias saídas do encontro. "Para o encontro, o Longonjo trouxe alegria, porque pela primeira vez estivemos frente à frente com a Vice-Presidente da República. Mas, as nossas preocupações têm a ver com os fertilizantes”, apontou.

    Florinda Jerónimo produz batata, milho e feijão. Nessa produção, como referiu, o mais difícil é a batata, por precisar de muito adubo. Confiante, disse que tudo com força e vontade acontece. O resultado do seu trabalho se reflecte, principalmente, na educação dos filhos e no sustento da família.

    Do município de Ekunha, Felícia Quintas trabalha no campo desde os 12 anos, idade em que as mães levam as filhas para trabalhar na lavra, de modo a aprender a actividade agrícola. A jovem fez questão de dizer que aprendeu a cultivar com o pai e a mãe.

    Felícia Quintas trabalha desde 2005 e  hoje, com 29 anos, produz batata-rena e doce, mandioca, milho e massambala, para o sustento da própria família. Entre as dificuldades, também está o adubo.

    No município do Cachiungo, segundo Fernanda Riangundi, cultiva-se a batata doce e a rena, ginguba, feijão, mandioca e soja. Habitante da comuna de Chinhama, Fernanda trabalha no campo desde 1992 e afirmou que gosta do que faz. Satisfeita com o encontro, que, para ela, foi de oportunidade, uma vez que se garantiu apoio, assim como destacado o trabalho e o potencial das mulheres do campo, e do que elas precisam, como enxadas, catanas, charruas, adubo e muito mais.

     
    Mais políticas de apoio à mulher

    O Executivo vai continuar a trabalhar, através do Ministério da Acção Social e Promoção da Mulher, no sentido de identificar soluções sustentáveis e definir políticas que apoiem mais a mulher, em particular a do meio rural, garantiu a Vice-Presidente da República, que reconheceu haver ainda grandes desafios, muitas dificuldades,  sobretudo no que diz respeito à produção no país.

    Ao dirigir-se às 200 mulheres que representavam os 11 municípios do Huambo, Esperança da Costa garantiu trabalho para ultrapassar todas as barreiras que impossibilitam a mulher de dar a sua contribuição efectiva no desenvolvimento do país.

    "Um dos grandes desideratos é o acesso à terra e nós tomamos boa nota. Mas também vamos  continuar a nossa campanha de sensibilização sobre a nossa legislação no que diz respeito à violência contra a mulher. Vamos continuar através do Ministério da Educação e solicitar apoio a todas as Organizações Não-Governamentais, para a questão da saúde reprodutiva e gravidez precoce. Tornar a educação mais expansiva com a construção de mais escolas, aumentar a alfabetização”, apontou.

     
    "As mulheres têm um grande parceiro”

    "Nós contamos com as mulheres e as mulheres podem contar comigo. As mulheres de Angola têm um grande parceiro, o Presidente da República, João Lourenço. Mamãs, o caminho é longo, mas vamos caminhar juntas e estou certa que vamos ultrapassar todos os obstáculos”, garantiu Esperança da Costa.

    Por outro lado, a Vice-Presidente da República disse acreditar que, muitas vezes, a busca de algumas soluções está na mulher, com o seu grande potencial de cultivar a terra e transformação dos produtos. Por isso, assegurou, as mulheres vão continuar a dar o seu grande contributo para se atingir a segurança alimentar no país.

    "A dificuldade que se coloca hoje da cesta básica não se justifica aqui na província do Huambo, no município do Cachiungo, porque as mamãs são produtoras, têm terras aráveis e o Executivo vai continuar a disponibilizar os insumos agrícolas necessários para que possam produzir cada vez mais”, frisou.

    No encontro, Esperança da  Costa considerou as mulheres grandes heroínas, que perfazem quase 80 por cento da mão de obra da agricultura familiar no país. Apontou as mulheres, aquelas que lideram várias famílias, e que apesar das condições, com a sua resiliência, não deixam que falte o alimento à mesa. Esperança da Costa acrescentou ainda que são as mulheres que disseminam a ética, o amor, a cultura e transmitem os seus conhecimentos de geração a geração.

    A governadora provincial do Huambo, Lotti Nolika, enalteceu o papel da mulher rural, por serem elas que fazem "andar” a província. Segundo Lotti Nolika, são as mulheres que produzem no campo, transformam os alimentos e com o seu suor, muitas delas, com o que ganham, têm os filhos hoje formados nas grandes universidades do país.

     
    Principais dificuldades

    A directora provincial da Acção Social, Promoção e Igualdade de Género do Huambo, Maria de Fátima Cawewe, disse que, apesar da mulher rural na província ser reconhecida com diversas potencialidades, ainda enfrenta enormes dificuldades no seu quotidiano.

    As dificuldades por que passa a mulher do meio rural do Huambo ultrapassam as do sector. Além das necessidades, por exemplo dos fertilizantes, terra, micro-crédito, utensílios de trabalho, elas clamam também por capacitação e formação profissional. Clamam, ainda, para os filhos, mais escolas, mais hospitais e centros de saúde, melhoria dos serviços médicos e medicamentosos, água potável e a requalificação das aldeias rurais, de modo a torná-las sustentáveis, e a construção de casas sociais.

    No encontro, foi levantada, também, a questão do elevado índice de violência doméstica no seio da mulher rural, e do alto índice de gravidez e casamentos precoces, motivados por questões culturais.

    A dificuldade de escoamento dos produtos do campo para os principais centros comerciais, devido à degradação das vias secundárias, terciárias, pontes e pontecos, é outra preocupação das mulheres rurais no Huambo.

     
    Dados da província  

    A província do Huambo já foi considerada o celeiro de Angola. É essencialmente uma província agrícola, sector em que a mulher rural encontra a principal forma de sobrevivência, produzindo, principalmente, milho, feijão, batata rena, batata-doce, mandioca e hortícolas.

    Segundo dados apresentados no encontro pela directora provincial da Acção Social, Família e Igualdade de Género, Maria de Fátima Cawewe, as mulheres no Huambo representam 52 por cento dos habitantes da província, ou seja, das 1.419.218  mulheres, 735.080 corresponde à mulher do meio rural.

    Maria de Fátima Cawewe referiu que a mulher rural, em particular a do Huambo, ocupa um lugar de grande destaque na família no sector produtivo e, consequentemente, na economia do país.

    A província do Huambo possui uma superfície total de 35.771.15 quilómetros quadrados, que corresponde a 2,87 por cento da extensão do território nacional. Tem 11 municípios, 37 comunas e 2.886 aldeias. Tem as faculdades de Ciências Agrárias e de Medicina Veterinária, unidades orgânicas da Universidade José Eduardo dos Santos (UJES), que são únicas a nível do país.

    Segundo a directora, o encontro com a Vice-Presidente da República serviu para fortalecer o diálogo com a mulher do meio rural, tendo em vista à recolha de subsídios para actualização e realinhamento do Plano de Desenvolvimento Nacional 2022-2027.